Fiscalidade e Contabilidade
A tributação de criptomoedas: conhece o enquadramento fiscal?
por Mariana Pimentel Gomes | 22 Junho, 2021
Num momento em que as criptomoedas têm vindo a ganhar relevo no plano financeiro internacional, e sendo usadas como investimento de elevado retorno financeiro, a urgência de serem reconhecidas pelas autoridades fiscais para pagamentos ou compras é cada vez maior.
E de facto, além de serem utilizadas como refúgio dos investidores para proteção dos seus ativos financeiros, as criptomoedas já são mais valorizadas do que o ouro. Por essa razão, é fácil de imaginar que estes ganhos não escaparão, no futuro, à rede do fisco.
Por ser um instrumento que gera, efetivamente, rendimentos, o tratamento fiscal destes ativos pode ainda suscitar algumas dúvidas.
Antes de mais, o que são as criptomoedas?
Antes de entrarmos no universo fiscal, é importante relembrar que os criptoativos são ativos financeiros digitais baseados em tecnologias de registo descentralizado.
Na prática, as criptomoedas são linhas de códigos informáticos, às quais é atribuído determinado valor e que, controladas por um sistema interligado de bases de dados (peer-to-peer network) guardam um registo de transações permanente (blockchain), que protege as criptomoedas de falsificações ou roubos, bem como a identidade do seu titular.
O valor de cada criptomoeda face às moedas tradicionais, como o euro ou o dólar, é calculado por um sistema de oferta e procura, em que novas moedas são geradas por utilizadores através de um processo designado “mining”. Isto faz do seu valor ainda um tanto instável, visto que o valor da criptomoeda pode mudar de dia para dia (ao contrário das moedas “estáveis”), mas cada vez mais as criptomoedas caminham para terem uma taxa de câmbio significativamente mais estável (as chamadas “stablecoins”).
Embora a penetração da criptomoeda em Portugal ainda seja baixa, já existem exemplos de grandes empresas a aceitarem este tipo de moeda, como o Sport Lisboa e Benfica, que foi o primeiro clube desportivo europeu a aceitar Bitcoin como pagamento. Internacionalmente, já várias marcas conhecidas aceitam criptomoedas para pagamentos, como Starbucks, Burger King, Pizza Hut, Twitch e AMC.
As criptomoedas e o seu tratamento fiscal
Atualmente, a criptomoeda mais conhecida é o Bitcoin. Em março de 2021, este tipo de criptoativo valia mais de 46 mil euros. Mas a verdade é que existem mais de 8.800 criptomoedas em circulação, cujos valores são distintos.
Contudo, este crescimento conduz ao maior problema: sendo um valor digital não sujeito a tributação em sede de IRS, além de não estar também sujeito aos constrangimentos das políticas monetárias e cambiais definidas pelos Bancos Centrais, esta ausência de controlo impulsiona a sua volatilidade e manipulação.
Por não existir enquadramento legal concreto relativamente a estes criptoativos, surgem dúvidas relacionadas ao seu tratamento fiscal, especialmente no que respeita à sua tributação em Portugal.
Porque razão não existe tributação de criptomoedas em Portugal?
As criptomoedas têm vindo a ser tratadas maioritariamente como ativos intangíveis e estas são as caraterísticas que fazem destes ativos únicos:
- A ausência de controlo centralizado;
- O anonimato;
- O carácter híbrido entre o ativo intangível e o instrumento financeiro;
- A sua difícil avaliação.
Todas estas características são o motivo responsável pelos desafios que se colocam aos legisladores tributários, não só pela dificuldade em definir um tratamento fiscal que englobe todas as diferentes características, como pela dificuldade em fixar tal tratamento, tendo em conta as constantes alterações na sua natureza.
O que diz a legislação portuguesa sobre a tributação de criptomoedas?
A discussão sobre a tributação das criptomoedas já surgiu. Dela resultou o relatório “Taxing Virtual Currencies”, que aborda os gaps existentes a nível legislativo para os principais tipos de impostos.
Contudo, a Autoridade Tributária (AT) defende que estes ganhos não pagam IRS, desde que a compra e venda de criptomoedas não seja atividade profissional ou empresarial do contribuinte. Além disso, esta falta de regulamentação mantém-se com a Lei do OE2021, que não contém qualquer norma acerca deste tema.
Por essa razão, o enquadramento tributário das criptomoedas em Portugal deverá manter-se como está. Ou seja, os ganhos realizados por investidores individuais, através da compra e venda deste tipo de moedas, estarão excluídos de tributação em sede de IRS em Portugal.
As informações vinculativas da AT sobre as criptomoedas
Em Portugal, a AT publicou apenas 2 grandes informações vinculativas sobre este assunto das moedas virtuais:
- Em sede de IRS, os rendimentos associados a criptomoedas não são tributados, por não se incluírem nem na definição de mais-valias nem na de rendimentos de capital para efeitos fiscais;
- Em sede do IVA, a simples transferência de moedas virtuais não é sujeita a IVA. O mesmo acontece quando troca as criptomoedas por euros ou outra moeda. Esta troca está isenta de IVA.
No fundo, em termos de IRS apenas terá que declarar os seus rendimentos e cumprir obrigações declarativas e fiscais caso as criptomoedas sejam a sua atividade profissional ou empresarial habitual.
O que esperar em termos fiscais?
A verdade é que existe uma grande incerteza no que respeita ao enquadramento fiscal deste criptoativo. Mas a crescente criação de guidelines nos restantes países da Europa leva a acreditar que, em Portugal, se chegue a um consenso relativamente à regulamentação das criptomoedas no universo fiscal num futuro próximo.
É certo que estes ganhos não escaparão à rede do fisco. Até lá, os rendimentos auferidos pela via da venda de criptomoedas sem carácter de habitualidade, está isenta de qualquer tributação. Contudo, é sempre aconselhável manter um registo fiável dos rendimentos, para que possa responder ao fisco, caso seja questionado sobre como conseguiu adquirir um determinado bem que pode não estar de acordo com os rendimentos declarados.
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